Página 163 - Olhar Peregrino paginadaOK4

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árvore e chorei muito. Devagar fui me acalmando e comecei a
pensar de que forma sairia desta situação. Vislumbrei meumarido
nesta situação e qual seria a reação dele, já que ele domina muito
bem suas emoções. Fui me acalmando, sorvi o último gole d'água
e, recobrando totalmente a calma, olhei do alto de onde estava e vi
várias trilhas e uma delas ou várias poderiam me levar onde eu
gostaria de encontrar meus amigos peregrinos. Fechei os olhos e
pedi a Deus uma orientação. Ele, então, apontou-me uma trilha,
não sei se a mais curta, longa ou acidentada. Fui por ela, não
encontrei marcas de botas e sim patas de cachorros e novamente o
pavor tomou conta de mim, mas continuei. Caminhei por mais
uma hora e nalmente avistei a cidade.
Foi o dia mais atribulado e feliz da caminhada. Aprendi
muito com meus erros, que foram vários, porque contrariei os
ensinamentos de nosso experiente guia: “Olhar atento à
sinalização. Andar sempre abastecido com água, nunca perder a
calma, não se afastar demais dos companheiros”.
Caminhar sozinho, acompanhado de uma ou mais
pessoas, caminhar perder a trilha, reencontrar, dormir ao lado de
umdesconhecido, dividir, compartilhar, ser solidário, ter empatia,
tudo isto vai nos transformando. E quando chegamos ao nal de
nossa caminhada, um grande sentimento controverso se apodera
de nós: Queremos muito chegar, abraçar São Tiago, assistir à
missa. Mas, por outro lado, queremos continuar, não chegar, pois
sabemos que sentiremos muitas, mas muitas saudades deste
intrigante Caminho.
A emoção é muito forte e já vamos planejando nossa volta.
Quemvai a primeira vez, sempre retorna por ele oupor outro.
Comigo aconteceu assim, voltei ao Caminho e percorri
outros tantos caminhos.
Estava viciada e, a partir daí, não tivemais como parar. São
tantos os caminhos a percorrer ainda, mas consciente de que a
magia, a euforia e a liberdade estão primeiramente nas trilhas do
Caminho de Santiago de Compostela.
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Rosângela Machado Balzan