A Mulher Que Fala

Autor: Lígia Maria Knabben Becker

Quero falar de tantas coisas que nem sei começar o meu palavreado. Não é um sermão como muitos acham e mesmo se fosse, somente aquele interessado em abrir os olhos e ver, escutar com ouvidos de ouvir e falar com boca solta, livre de conceitos pré-determinados poderia fazê-lo.

Quando o desânimo chega e traz consigo a tristeza apenas a palavra, seja ela falada ou escrita reviram meu lado escuro e jogam um pouco de luz em uma vida tão cansada de tentar ser compreendida.

Por que você não me escuta? Agora não dá, tenho que ir trabalhar; agora não, tenho que almoçar; agora não, tenho que ver televisão, o filme de hoje vai ser bom, ou apenas fica trocando de canal em busca do não-sei-o-quê; agora tenho que ir dormir, tô cansado ou fala logo que não posso esperar muito….

Que saco!

A generosidade da comunicação onde está?

Você tá me ouvindo? Tenho que marcar hora pra conversar com você?

Falo demais? Nem percebeu como ando quieta e calada nos últimos tempos? Prefiro te escutar. Saber de você. E nada também.

Chata, eu? Sou é persistente, quero ser notada, acarinhada, me sentir importante, me sentir viva.

Porque você não me vê? Nunca me elogia, faço unha, pinto e corto o cabelo, a roupa é nova e nada. Fico sem falar, faço seu prato preferido, capricho na arrumação da mesa, da casa, da cama e nada…

Virou surdo? Problema na vista? Eunuco?

Porque você não fala comigo? Lá na reunião você não deixou ninguém falar, parecia até que nem respirava, engasgado com tanta palavra.

Sei, sei, me disseram que existem pessoas com ouvido seletivo, só ouvem e respondem quando é do seu interesse.

Você não é assim? Claro que não, só me lembrei de dizer, nem sei o porquê disso. Também nem sei porque veio na minha cabeça a imagem daqueles três macaquinhos, um tapa a boca, outro os ouvidos e o terceiro, os olhos. Bobagem? Pois eu não acho. Dá pra pensar .

Por que você, por que você…. Droga! Deixa pra lá.

Vou ao analista.