A Pena.

Autor: Jairo Ferreira Machado

Lá estava a pena dentro de uma lapiseira sobre o balcão da recepção, junta a outros objetos; aquela lindeza de pena. Ele chegou, arriou das costas a mochila e pediu ao recepcionista que carimbasse a sua credencial, o que o mesmo fez com o riso no semblante, dado as circunstâncias – o recém-chegado tinha o chapéu enfeitado de penas.

E esse olhou mai uma vez a pena e, não resistindo à curiosidade e o interesse, perguntou: Pena de que, jovem? – De pavão, respondeu o recepcionista, mais uma vez reparando no seu chapéu – um incomum relicário: eram as penas recolhidas pelo caminho naquele dia, que por falta de melhor espaço na mochila, ele as enfiava no chapéu.

– Eu faço coleção, quem sabe você me dá esta aí de presente, arrematou o recém-chegado. O recepcionista o olhou, em princípio, indeciso, deixando transparecer que a pena lhe era de estimação. Mas rendeu-se àquele singelo pedido, retirou a pena da lapiseira e o entregou.

Agora, o peregrino já não tinha certeza se era merecedor dela? Mas agradeceu, pensativo, enquanto enfiava a pena no chapéu.

Afastou-se do local, lanchou, foi ao banheiro, e voltou decidido a devolver à pena, antes que continuasse a viagem, dizendo – Agradeço a sua bondade meu caro, mas não é justo! A pena é sua. E aqui, onde ela estava, poderá ser admirada por todos. E decerto estará mais segura.

– Não! – retrucou o jovem – a pena é do senhor. Ela esteve aqui todo esse tempo, esperando pelo senhor, portanto, ela lhe pertence.

– Mas moço, eu posso perdê-la, já que venho a pé por este mundão afora, o vento às vezes quase me arranca o próprio chapéu…

– Eu entendo, disse o recepcionista, mas a pena será do senhor, enquanto puder mantê-la consigo. Se perdê-la, decerto alguém a encontrará e então ela terá outro dono. Por favor, fique com a pena, disse o recepcionista, emocionado, com os olhos rasos d’água.

Mas antes recomendou – Lembre-se que é uma pena de pavão. E o pavão é um pássaro sagrado, misterioso e de muito poder espiritual, concluiu.

Foi com o eco daquelas bonitas palavras nos ouvidos que o peregrino se foi. Tinha também os olhos rasos d’água.

A pena chegou ao destino e tem um lugar de destaque na casa do seu novo dono. A considerar os mistérios e os desígnios dessa vida, até quando ela será dele, só Deus sabe…