A Roda Gigante



Autor: Jairo Ferreira Machado

Ficou em pé olhando a roda gigante girar. Girava com ela. Uma abóbada celestial, só que ali bem próximo de seus olhos, as luzes se deslocando no espaço como estrelas cadentes, só que desta feita também as estrelas iam para os céus em vez de só se despencarem de lá: lâmpadas contornavam o entorno da roda como castiçais iluminados. No assento dos bancos da roda gigante, temendo às alturas, mas querendo estar ali, iam alguns namorados ou pretensos namorados, casais, eufóricos, para o mais sublime acontecimentos daqueles tempos: a viagem beirava ao mais puro romantismo, minha estrela, ele diria a ela, meu astro, ela diria a ele, os olhos cheios de brilho.

Nesse momento ele estava lá, bem no alto, quando a roda parou para subir ou descer alguém, no lado oposto, junto ao chão, breque àquele que provocou um movimento oscilatório do banco onde estavam, e ela soltou um gritinho e logo pegou sua mão, era aquela a primeira vez, talvez a única, e ele quis socorrê-la, só que foi além, aplicou-lhe um beijo na boca escancarada de medo, aplacando seu medo também, antes que morressem daquele balançar, vez que já estavam bem perto dos céus, e de Deus, decerto Deus aprovaria seu gesto desesperado, aproveitador, destemido, ou foi aquilo medo também dela morrer ali, da queda, e nunca mais a beijaria… Aquela boca carregada de batom, produzida especialmente para aquele domingo, no parque. Ele estaria lá.

Foi uma eternidade aquele momento. Agora, o parque já não era o mesmo daqueles tempos, e tampouco ele. Lembrava. O coração dela galopava e sua boca, não diria a boca dela, para não empobrecer o texto, mas vinha lá de dentro um calor inesquecível, de ardor, de censura não, ela estava esperando muito tempo por aquele momento, ele também, o parque chegara recente ali, tocava uma música, porque não para relógio, mas queria mesmo era que a roda gigante parasse para sempre e nunca mais desceriam de lá, daquele céu particular, o cheiro do batom inebriando os seus sentidos e a fragrância de cio lhe vindo de entre os seios, a saliva, essa, inesquecível, trocavam um fluído misturado ao deslumbre virginal, que não sabiam de onde vinha.

As lembranças são tão reais que a roda gigante parece ainda parada lá embaixo, esperando alguém subir ou descer, e ele e ela, lá em cima, no céu particular dos dois. As estrelas do céu ofuscadas pelas luzes da roda gigante e a música ainda soando: porque não para relógio… Ficou em pé, olhando a roda gigante rodar e de seus olhos fluíam lágrimas… A netinha pegou-lhe a mão e pediu: Vô, me leve lá…