Jairo Ferreira Machado
Via-se rebaixado de tal maneira o céu que as nuvens pareciam tocar as colinas, logo, se não era chuva era outono – o céu bem próximo da terra – essa ainda molhada do sereno da madrugada e o sol mostrava lá a limpidez dos arvoredos garoando o orvalho da manhã, pingos de prata ou lágrimas de contentamentos, caindo de seus olhos...
Também a vegetação estava alegre, assaz um presente caído dos céus, era um dia de muitos céus e muitos azuis, a terra não cabendo em si de alegria – chovera de véspera – a manhã alvissareira, a flor branco-lilás do assa-peixe e as abelhas lá colhendo o néctar, tão real que podiam sentir o cheiro do mel, enquanto caminhavam por ali.
Nas cercas de arame a aranha tecera sua teia onde os raios de sol reluziam rendas e um ou outro inseto, incauto, ali enroscado à noite, enquanto ela dormia; mas tão logo a aranha acordasse, viria devorá-los. Perto, nos fundos do vale o riacho sussurrava manso em meio ao nevoeiro que aos poucos escapava em direção à atmosfera, consumindo-se devagar, como se não quisesse ir...
Na relva macia e fria pastava um cavalo, que sequer olhou para os peregrinos passando, de mochilas nas costas.
Das encostas vinham beijar-lhes o rosto as aragens da manhã; purificadas e espetacularmente santas. Devagar uma lesma concluía a travessia da estrada, antes que o sol tornasse o chão impraticável. Marrecas faziam revoadas em volta do açude, vindas sabe-se lá de onde? Ali, o frango d’água anoitecera e amanhecera, dono do lugar.
Entrementes, mentes sadias, subindo o morro, num entreter-se entre as mil alegorias em volta, e as miudezas e grandezas produzidas pelo seio da terra: os seios da mulher amada onde o homem se apraz ou de uma mãe, onde uma criança se deleita.
Naquele momento voltamos a ser crianças, levando conosco os nossos sonhos de vida; no entanto, para nós, os caminhos são nunca suficientemente percorridos, andados, como uma eterna chama no nosso peito, e até onde se sabe: também inexplicáveis... Pois temos a alma peregrina.
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